Produção artesanal de Biocarvão a partir de casca de coco e da madeira da algaroba para reflorestar a Caatinga
O processo de regeneração de solos degradados no bioma Caatinga tem sido um desafio principalmente para pequenos produtores rurais do Semiárido, visto a falta de recursos viáveis ao contexto local. A baixa fertilidade dos solos devido, principalmente, à inadequação de seu uso com práticas agrícolas extensivas e a ocorrência de extensas áreas descampadas para pastoreio caprino-bovino são alguns dos fatores degradantes que podem levar estes sítios a processos severos de degradação e conseguinte avanço de riscos à desertificação.
O Biocarvão, ou Biochar, é um material sólido rico em carbono, produzido a partir da carbonização de biomassa (como restos de madeira, resíduos agrícolas como a casca de coco verde e da madeira de algaroba) em condições de baixa ou nenhuma oxigenação e é usado principalmente como corretivo de solos, contribuindo na retenção de água e reduzindo a emissão de gases de efeito estufa, conforme nos explica a doutoranda Susan Cañote.

Através de seu projeto de doutorado junto ao grupo de pesquisa Biorrefinaria Experimental de Resíduos Sólidos Orgânicos (Berso), da Universidade Federal de Pernambuco, a engenheira industrial Susan Cañote, de nacionalidade Peruana, vem trabalhando há alguns anos com metodologias para a produção artesanal do biocarvão com resíduos sólidos cuja destinação inadequada tenha gerado impactos socioambientais. Conforme nos explica: “o biocarvão é um produto com foco em melhoria do solo e sequestro de carbono, onde busca-se um controle mais preciso dos processos e da matéria-prima, visando otimizar suas aplicações como condicionador de solo e mitigador de mudanças climáticas”. O papel do CCBA no projeto de doutorado da Susan tem sido fomentar os experimentos práticos através da disponibilização de equipamentos para realização de seus ensaios e oficinas.
Um dos resíduos utilizados como matéria-prima para experimentação da produção de Biocarvão pela pesquisadora é a casca de coco verde. Na região do Vale do São Francisco, por ser uma área de grande produtividade frutífera é observado uma outra questão: o acúmulo do coco verde em grandes extensões de áreas não vegetadas, contribuindo para exposição do solo a processos intempéricos erosivos. A este fato, destaca-se ainda que, em seu descarte a casca do coco é deixada em processo de decomposição em solo descampado sem qualquer tratamento que iniba a liberação desenfreada de gases de efeito estufa durante a decomposição.

Além deste, outra matéria-prima utilizada é a a madeira de algaroba (Prosopis juliflora), a qual, no contexto do semiárido nordestino, é uma problemática que perpassa diversos aspectos, desde a sua proliferação exacerbada em áreas de vegetação nativa até a sua eliminação, envolvendo, geralmente, a queima irregular.

Partindo da necessidade local de destinação dos galhos secos da algaroba e da casca do coco verde percebeu-se o potencial destes como matéria-prima para produção artesanal do Biocarvão. Com o auxílio do forno Kon-Tiki, cedido pelo Centro Cultural Brasil-Alemanha no Recife (CCBA) ao IF-Sertão em Floresta através do projeto AGREGA, foi possível realizar as primeiras atividades experimentais com a matéria-prima para obtenção do Biocarvão na Escola Fazenda do IFSERTÃO, campus Floresta. Constatou-se que a produção do Biocarvão pode promover maior fixação de carbono das cascas na própria matéria que será transformada em biochar, reintroduzindo uma parcela deste carbono, utilizado como fertilizante natural, novamente ao solo.
Veja aqui o passo-a-passo para produção do Biocarvão
No que diz respeito à diferença entre o Biocarvão e carvão vegetal produzido em carvoarias esta vai desde a origem de sua biomassa e do processo de produção às suas aplicações. A engenheira Susan Cañote os difere elucidando que “o biocarvão é frequentemente produzido a partir de biomassa controlada e homogênea, como resíduos agrícolas, sob condições de baixa oxigenação e temperaturas controladas, com o objetivo principal de melhorar a qualidade do solo. Já o carvão vegetal tradicional é obtido por queima em condições menos controladas e pode ser utilizado para fins energéticos”.

Uma das problemáticas da comercialização do carvão vegetal são as condições irregulares de sua produção, especialmente com uso indiscriminadamente de madeiras em áreas sem devido manejo, contribuindo para o desmatamento gradual de vastas áreas. Ademais os fornos rudimentares para sua produção liberam grandes quantidades de gases de efeito estufa e poluentes atmosféricos.

Ainda com relação às distinções entre o uso do carvão vegetal tradicional e o biocarvão, a partir do desenvolvimento de suas pesquisas, a Susan aponta que os principais impactos positivos do biocarvão para o meio ambiente, seria sua aplicação principalmente como condicionador de solo, melhorando suas propriedades físicas, químicas e biológicas, como a retenção de água e liberação/fornecimento de nutrientes, enquanto que o carvão vegetal é utilizado como fonte de energia, ou seja, principalmente como combustível para queima (liberando CO2).

Neste cenário, o biocarvão (biochar), para os produtores rurais do semiárido nordestino, pode ser uma alternativa viável para diversas questões associadas à degradação do solo e ao aumento da fertilidade em áreas rurais produtivas. Enquanto alguns dos benefícios deste componente podemos citar, conforme identificados pela pesquisadora: melhoria da fertilidade do solo, aumento da produtividade e estrutura dos solos, alternativa para resíduos agrícolas e florestais, melhoria da capacidade de retenção de água no solo e, adicionalmente, sua aplicação ajuda a reduzir a emissão de gases de efeito estufa com o sequestro de carbono.

A sua produção (produz menos impactos ambientais e o mesmo) serve de insumo para diversas aplicações associadas às práticas sustentáveis de regeneração e correção de solos, além de sua capacidade de “sequestro de carbono” como um agente mitigador contra o aumento de emissões dos gases de efeito estufa (GEE). Ademais sua interação com o solo é um forte aliado nos projetos de reflorestamento do bioma caatinga, tendo em vista sua elevada capacidade de adubação.
Confira duas palestras do Professor Romulo Menezes (UFPE), orientador de Susan e parceiro do CCBA e do Professor Bergson Bezerra (UFRN), proferidos durante a oficina “Sequestro de carbono na caatinga e serviços ecossistêmicos” promovida pela Articulação Semiárido Brasil.

No intuito de fomentar essas atividades, pesquisadores do IFSertão (Floresta) irão começar a produzir este material para experimentos na própria Escola visando direcionar seus resultados aos produtores locais.
Assim, em formato consolidado e com a proposta de instruir os agentes que estarão responsáveis pela produção do Biocarvão na Escola Fazenda do IFSertão foi oferecido pelo CCBA entre os dias 13 e 15 de junho o curso: “Biocarvão para reflorestamento da Caatinga”, coordenada pela engenheira Susan Cañote com participação da consultora externa Monique Azevedo, especializada na área de biologia especificamente com plantas e substratos. Ambas as as pesquisadoras ministraram a parte teórica e prática do curso nas instalações do IFSertão.
O curso foi realizado através da parceria institucional entre o IFSertão e o Centro Cultural Brasil Alemanha no Recife (CCBA), com o apoio da organização alemã sem fins lucrativos Atmosfair, e da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Além disso, contou com a representação do Programa de Desenvolvimento Territorial do Banco do Nordeste (PRODETER-BNB).


