Escola Fazenda do IF Sertão desenvolve projeto para “recaatingamento” do semiárido em parceria com o projeto AGREGA do CCBA

Diante das questões climáticas globais, o semiárido nordestino é uma das regiões mais vulneráveis aos efeitos das mudanças no clima, tendo em vista, o aumento dos dias quentes e a diminuição de dias com chuva, segundo o sexto relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), publicado em 2023. É com esta preocupação que pesquisadores da comunidade científica e entidades voltadas a projetos ambientais se unem para fomentar parcerias que estimulam o desenvolvimento sustentável local.

A Escola Fazendo do IF Sertão, do Instituto Federal de Pernambuco, campus Floresta – PE, que vem se estruturando há mais de dez anos em uma área de 100 hectares, é uma amostra de como as Instituições de ensino podem se incorporar às demandas locais buscando alternativas viáveis, por meio do conhecimento científico, para gerenciar os problemas voltados à população.

Banco de sementes

O Projeto AGREGA – Agroecologia com Energias Alternativas para todos foi criado pelo CCBA em 2018 em parceria com a ONG alemã Brasilieninitiative Freiburg e conseguiu desenvolver atividades e miniprojetos com cultivo agroecológico, energia solar, piscicultura e distribuição de alimentos em diversos municípios de Pernambuco e com vários parceiros locais.

Com o IF Sertão em Floresta o CCBA  estabeleceu em 2024 uma cooperação oficial através de um Convênio por meio dos professores do IF Sertão, Iran Torquato (Engenheiro Agrônomo) e Danilo Pereira (Engenheiro Agrônomo), e do diretor do CCBA, Christoph Ostendorf, como um Projeto de Extensão desenvolvido pelo Núcleo de Estudos Agroecológicos (NEA) do IF Sertão. O AGREGA atua principalmente com o apoio de recursos e experiências próprios e de organizações alemães para subsidiar os trabalhos executados na Escola Fazenda voltadas a dois principais eixos: o chamado “recaatingamento” e às pesquisas experimentais com o biocarvão.

Da esquerda para direita, professores Iran Torquato e Daniel Pereira

O estágio atual desta parceria se encontra em desenvolvimento com a experimentação de técnicas de “recaatigamento” em uma área de um hectare, dividido em talhões, onde estarão sendo testados diferentes técnicas de regeneração da vegetação nativa. A etapa inicial consiste na retirada das algarobas (Prosopis juliflora), vegetação não nativa, invasora, que impede o florescimento do bioma naturalmente. O professor Iran Torquato destaca a importância de compreender a necessidade da retirada desta espécie antes de iniciar todo processo, pois a recuperação deve ser concebida nas melhores condições possíveis para o bioma. Sendo assim, a retirada da espécie invasora tem um fator determinante.  

Área de um hectare cercada onde serão testadas diferentes técnicas para regeneração da cobertura vegetal nativa.

Sendo assim, como apontam os professores Iran Torquato e Danilo Pereira, a algaroba é uma das maiores problemáticas enfrentadas pelos pesquisadores na Escola Fazenda, problema este que é um reflexo da realidade local, tendo em vista que ela se alastra rapidamente e suas raízes impedem a geminação da caatinga devido ao seu caráter parasitário afetando assim gravemente a biodiversidade do bioma.

Algaroba (Prosopis juliflora). Destaque para o aspecto alongado e espinhoso de seu caule.

Às margens do Riacho do Navio, principal afluente do Rio Pajeú no município, o retrato que se tem é o avanço desenfreado desta vegetação em seu leito fluvial e a consequente inibição do desenvolvimento da mata ciliar nativa. Além disso, uma questão enfrentada por muitas localidades no semiárido nordestino é o pisoteio de animais, principalmente de cultura caprino-bovino, levando à compactação do solo e aumento da erosão das margens deste rio.

Margem direita do Riacho do Navio com severo processo de intemperismo físico (erosão) e forte atuação da ação radicular das raízes das plantas no solo degradado.

 Uma das técnicas a serem utilizadas para auxiliar no reflorestamento é o uso do biocarvão como biofertilizante. A partir da retenção de carbono, além dele contribuir para o sequestro de carbono do solo e da atmosfera, ele potencializa a retenção de nutrientes no solo e gradual transferência para a flora nativa. O CCBA com apoio da organização alemã atmosfair gGmbH conseguiu construir dois fornos Kon-Tiki de 1.000 litros dos quais um está sendo cedido ao IF Sertão e outro se encontra cedido à UFPE (Projeto BERSO) para uma pesquisa de doutorado da engenheira peruana Susan Cañote.  Esses fornos possibilitam um processo de pirólise no qual acontece uma carbonização de resíduos orgânicos, como cascas de coco e cortes de algarobas, e o carbono continua no biocarvão para posteriormente voltar para o solo.

Forno de pirólise para o biocarvão.

O experimento se dará por meio desses fornos de pirólise artesanais construídos para pequenas propriedades cuja proposta, sobre uma égide agroecológica, como os resíduos orgânicos podem retornar ao meio de modo a contribuir para sua sustentabilidade. Além de ser utilizado como biofertilizante, o biocarvão também poderá utilizado como insumo para outros compostos, como biocombustíveis e aditivos para materiais de construção.

Além das atividades de pesquisa e extensão até então mencionadas, a Escola é estruturada na execução de outras demandas voltadas ao campo, como estudos de melhoramento genético bovino-suíno e monitoramento de espécies florísticas nativas do bioma caatinga. Um viés que esteve presente desde o início da Escola é a “pesquisação” e constante melhoramento de espécies de plantas frutíferas, hortaliças, raízes e, em especial, do cultivo da palma forrageira como alimento alternativo para o gado. A produção desse alimento é distribuída entre a população por meio de associações e grupos de agricultores.

Cultivo de bovinos para melhoramento genético

O espaço é pensado para o desenvolvimento pedagógico de atividades práticas. Como mencionado por uma das zootecnistas do projeto, os cultivos de milho presentes foram frutos de um curso de agricultura familiar ministrado para mulheres. O corpo de colabores da Escola vão desde os professores orientadores, técnicos, estagiários, bolsistas e voluntários como o intuito de fomentar as pesquisas e práticas das atividades internas.

Cultivo de milho resultado de curso de agricultura para grupo de mulheres

A parceria com o CCBA e o projeto AGREGA segue firme e com projeções promissoras visando o monitoramento do avanço da regeneração do bioma, a partir, principalmente, do biocarvão e das diferentes técnicas utilizadas para melhoramento das condições superficiais do solo no semiárido.